O desafio para determinar de quem é a autoria da obra
Francis Gurry, ex-diretor geral da Organização Mundial de Propriedade Intelectual – WIPO, afirma: “a inteligência artificial é a nova fronteira digital que vai ter um impacto profundo no mundo, transformando o nosso modo de viver e trabalhar.”
Como exemplo da complexidade do debate em torno do direito autoral trazido pela Inteligência Artificial – IA, em agosto de 2022, a Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual – INPI, expediu um parecer explicando a impossibilidade da indicação ou nomeação de inteligência artificial como inventora em um pedido de patente e, apontou a necessidade de que seja editada uma legislação específica que passe a disciplinar a inventividade desenvolvida por sistemas de IA.
Antes de ingressar na legislação, é necessário entender como a IA funciona. O machine learning – aprendizado de máquina, permite que os computadores identifiquem padrões em grandes volumes de dados e façam previsões de forma autônoma, usando algoritmos independentes do programador. Isso significa, uma vez alimentada com informações e dados, a IA age e produz resultados sem o controle direto do autor humano.
Analisando a legislação atinente a IA, temos no Brasil, a Lei 9.609/98, que trata sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador e, segundo a lei, autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica, portanto, não é possível que a IA seja autora de obra nacionais. Ademais, os Estados Unidos e União Europeia têm o mesmo posicionamento frente às obras criadas por IA, ou seja, não poderão ser registradas em nome destas os direitos autorais, pois esses pertencem à pessoa física.
Segundo o Copyright, Designs and Patents Act, do Reino Unido, “nos casos de criação de trabalhos literários, dramáticos, musicais ou artísticos por computadores, o autor será a pessoa que fez os arranjos necessários para a criação da obra em questão”, ou seja, a propriedade intelectual é atribuída a uma pessoa física que possibilita a criação da obra pelo computador, não à máquina, podendo o autor ser o programador ou alguém que inseriu dados ou definiu diretrizes que levaram à criação da obra tal como se deu.
Em contrapartida, na China, a corte da cidade Shenzhen decidiu em benefício da empresa de tecnologia Tencent, que a IA, chamada de Dreamwriter – que escreve notícias sobre finanças e esportes, é a real autora do conteúdo criado.
Na contramão dos referidos entendimentos, existem quem defenda que obras criadas por IA pertencem ao domínio público, ocasionando na ausência de proteção pelos direitos autorais. Contudo, tal postura enfraquece o do desenvolvimento de inovações no campo de IA e tem sido considerada obsoleta.
No Brasil não há legislação específica sobre o tema, mas existem dois projetos de Lei, o n.º 5.051/2019, que visa estabelecer os princípios para uso da IA e o n.º 5.691/2019, que institui a Política Nacional de IA, para equilibrar as vantagens e os riscos de sua adoção, contudo, esses projetos de lei continuam em fase de tramitação.
Os avanços tecnológicos necessitam de uma regulamentação específica que garanta sua eficiência no mercado e segurança jurídica perante terceiros. Entender e aplicar propriedade intelectual no tocante à inteligência artificial, machine learning e robôs criativos ainda é uma problemática relevante.
Atualmente, no Brasil, a solução jurídica é o uso da legislação comparada, desde que aplicada somente para adequar as particularidades do ordenamento jurídico do brasileiro, em específico a Lei de Direito Autoral – n.º 9.610/98 e a Lei do Software – n.º 9.609/98.